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quarta-feira, 8 de janeiro de 2014

“Não vai rolar”, afirma Max Cavalera sobre reunião da formação clássica do Sepultura

Max Cavalera tem histórias para contar. Em quase trinta anos de atividade, o vocalista e guitarrista ganhou status de ícone frente ao Sepultura, banda que ajudou a fundar e liderou durante mais de uma década.
 
Após uma separação amarga em 1996, ele fincou pé nos Estados Unidos e se afastou dos ex-colegas de banda, mas jamais deixou de se dedicar à música pesada. O projeto mais constante, o Soulfly, acabou de render um novo disco, Savages que contou com a participação de Zyon, o filho mais velho dele, na bateria. Ao mesmo tempo, Max se manteve na mídia por conta da recém-lançada e polêmica biografia My Bloody Roots, na qual distribui farpas para desafetos e expõe sentimentos ressentidos sobre o desmembramento do Sepultura. Falando por telefone de Phoenix, o músico de 44 anos divagou sobre o hábito de trabalhar com familiares, deu pistas de projetos futuros e explicou detalhadamente porque acha que uma reunião do Sepultura “clássico” não deverá acontecer.

Fazer música em família é algo que funciona para você. Tocou por muitos anos com o Iggor, o seu irmão, no Sepultura; mais recentemente, criou o projeto Cavalera Conspiracy com ele. Agora, você gravou o novo disco do Soulfly, Savages, com seu filho, Zyon.
Aqui não para nunca, a gente está sempre em ação [risos]. O Savages é um disco especial por muitos fatores. Um deles é ter o Zyon na bateria – a batida do coração dele abriu o Chaos A.D. do Sepultura 20 anos atrás, e hoje ele está com 20 anos, cresceu e virou um baterista muito bom. Acabei fazendo umas turnês com ele, até tocamos juntos no Brasil com o Soulfly e ele detonou. Eu estava procurando um baterista para fazer um CD novo e o Zyon chegou e disse: “Pai, eu faço. Se você quiser, eu consigo fazer a bateria do disco novo pra você”. Eu falei: “Isso é diferente de tocar ao vivo, cara. Disco é foda, tem muita coisa envolvida”. Ele nunca tinha gravado nada profissional, só as demos das bandas dele. Ele respondeu: “Me dá um crédito, tenta comigo”. Aí peguei minha guitarra, fui no quarto dele e mandei três riffs pra ver como ele ia reagir. E ele botou uma batida animal. Aí me senti mais seguro e achei que essa historia ia dar certo.

E como funcionou a dinâmica?
Pensei que como já estávamos com o equipamento montado, eu com as guitarras e ele com a bateria no quarto, eu poderia trabalhar nessas músicas em casa, invés de fazer tudo no estúdio. Foi a chance de fazer uma coisa diferente, que foi trabalhar o disco antes. Foram dois meses que ficamos do meio dia às sete da noite: íamos pro quarto, eu tocava riff atrás de riff, gravávamos tudo, tocávamos de novo no outro dia. Entramos no estúdio superpreparados. Quando eu trouxe a banda pra Phoenix para aprender as musicas, tivemos uma semana de ensaio antes de entrar no estúdio, e ficamos bem afiados.

Dá para dizer que a experiência de gravar com o Zyon melhorou a relação de vocês? Porque fazendo música vocês eram companheiros de banda, e não pai e filho.
Acho que melhorou, aproximou a gente mais. No passado eu era mais conectado com o Igor, meu filho mais novo, porque ele gosta mais de som porrada, igual eu. O Zyon é mais roqueiro clássico, Led Zeppelin, Black Sabbath, Rush, ele nem gosta de death metal. Ele reclama que é só barulho. O legal de trabalhar com o Zyon foi que isso uniu a gente mais. Mas você está certo, quando eu estava com ele fazendo o disco, era um relacionamento mais de músico para músico, e não de pai e filho. Eu levei super a sério, e falei que ele tinha de levar a sério. Achei legal esse lance de família. Foi igual a tocar com o Cavalera Conspiracy. Adoro trabalhar com o Iggor, e digo que trabalhar com o meu filho e com o meu irmão são coisas parecidas. Até o jeito que eles tocam é meio parecido. A batida: o Zyon não bate tão forte quanto o Iggor, mas ele tenta. O Iggor faz a bateria ter som de trovão.

E o que a Gloria [Cavalera, mãe de Zyon e mulher de Max] achou dessa história?
Ela adorou. Ela até influenciou na decisão. Eu estava em dúvida no começo - é foda, baterista é muito importante, e no começo eu considerei outros nomes, mas o Zyon entrou na fita. A Gloria se animou com a ideia e disse: “Dê uma chance pro seu filho, ele quer te mostrar que é capaz. E você teve uma chance quando era moleque, então dê uma chance a ele.” E eu expliquei pra ela que isso é uma coisa séria, é um disco de uma banda já formada, que tem fã no mundo inteiro e da qual se espera certa qualidade. Não pode cair o nível.

E as carreiras dos seus filhos? Você pretende fazer mais projetos com eles?

Eles adoram música - o Igor saiu da escola pra continuar sendo só musico. Eles estão bem com o Lody Kong. As músicas estarão logo no iTunes, estão procurando contrato com uma gravadora. Para mim o legal é que eles façam o caminho deles mesmos, esse lance do Zyon com o Soulfly é só no Savages. Daqui pra frente eu acho que vou acabar encontrando outro baterista pra continuar a carreira do Soulfly e deixar o Zyon fazer a carreira dele com o irmão. Acho que eles têm o caminho traçado e eu não quero atrapalhar. Mas adorei a experiência com o Zyon e agora vamos fazer a turnê no ano que vem. Para frente, eu gostaria de ver eles com a banda deles e o Soulfly em um caminho próprio.

E o próximo disco do Cavalera Conspiracy?
Estou escrevendo agora, compondo nesses dias que estou em casa. Já fiz 20 músicas que vou mandar pro Iggor e vejo o que ele acha. Vamos gravar aqui em Phoenix com o John Gray, um engenheiro de som bom pra caramba, e convidamos o Nate [Newtondisco] Arise. Pra mim é um sonho e acho que o mundo inteiro ficaria de queixo caído se ouvisse um CD inteiro do Cavalera bem porrada. Vou deixar o groove de lado e trazer só a porradaria. Quero ver o Iggor tocando rápido. É bom ele estar em forma [risos].

E essa notícia de que você e o Iggor irão gravar um projeto com produção do James Murphy, ex-LCD Soundsystem? Quanto de verdade há nessa história?
Essa ideia surgiu no camarim de uma das turnês do Cavalera. A gente estava trocando uma ideia, e ele sugeriu que a gente fizesse um EP só nós dois e mais ninguém, só os dois irmãos. Ele falou: “Eu conheço um cara pra gravar isso”, que é o James Murphy, amigo dele. Mas a gente não falou para quando seria essa história – seria para o futuro, né? Eu acho que acabou confundindo as pessoas, porque essas reportagens saíram na Inglaterra e acharam que seria o próximo CD do Cavalera. Mas não é, o próximo vai ser de banda, um disco normal. Mas eu acho legal essa ideia com o Iggor. Eu não sei se sairia com o nome Cavalera Conspiracy, tenho que falar com ele sobre isso. Talvez a gente bote outro nome no lance, já que não é totalmente o Cavalera – seria só os dois irmãos.

Na teoria, essa ideia parece fazer bastante sentido. O James Murphy tem uma habilidade, digamos, “especial” de extrair sonoridades dos artistas.
Você viu o documentário dele, o Shut Up and Play the Hits? É sobre o ultimo show [do LCD Soundsytem] no Madison Square Garden, quando ele terminou a banda. Tem coisas bem punk no som dele, né? Bem primitivo. Então, essa ideia ainda está de pé. Quero fazer isso com o Iggor, acho que é algo que faria bem pra nossa relação com o irmão, de unir a gente mais. Eu confio no Iggor, confio no James Murphy, e acho que dá para sair coisa boa daí. Mas é mais para o futuro.

A sua autobiografia foi lançada recentemente no Brasil e causou uma boa polêmica. Você ficou sabendo de algo?
Teve bastante repercussão. E teve muitas revelações, né? [risos] Sobre o Sepultura, contei coisas engraçadas, eu vomitando no Eddie Vedder, tem gente que não sabia dessa história. E tem coisas que deram bastante fofoca e confusão, né? O lance da Mônica [Cavalera], de eu ter chamado ela de “piranha” no livro. Eu continuo com a minha afirmação - pra mim não muda nada, eu não gosto e nunca gostei dela. Acho que o que ela faz com o Sepultura é muito de mau gosto. Ela não é empresária, não sabe nada do assunto. E acabei falando do Paulo [Xisto], que ele não tocou na maioria dos discos, que eu e o Andreas [Kisser] fazíamos o baixo... E acho que isso gerou muita polêmica, né? [risos]

Você se autocensurou de alguma forma, impôs algum limite ao que iria revelar? Ou escreveu tudo o que quis?
Eu falei o que eu quis falar, cara. Não teve censura nenhuma. Inclusive pra mim, senti que lavei a alma com a biografia, falei de tudo, até das minhas drogas, do problema com o álcool, que eu lutei a vida inteira com essa porra. Uma luta muito difícil, que eu finalmente consegui vencer. Foi legal colocar isso no livro, porque muita gente nem sabia que, durante muito tempo, na época do Sepultura e do Soulfly, eu abusei de drogas e de álcool.

Ao mesmo tempo em que no livro sobraram criticas para uns, outros foram poupados. O Andreas Kisser, por exemplo, não teve citações negativas no livro.

O Andreas, eu tenho respeito por ele como músico. Acho ele muito bom, e o que a gente fez juntos, a nossa parceria, é muito legal. Não tenho como não tirar o chapéu pelo que a gente fez. Nosso trabalho no Sepultura nessa época de ouro, se quiser chamar assim, no Arise, Beneath the Remains, e principalmente no Chaos A.D. e no Roots, em que a gente se entrosou mais. Coisas como “Ratamahatta”, e a “Kaiowas”, que foi feita aqui em casa, no violão, eu e ele tocando junto. O refrão da “Territory” foi feita no meu quintal, eu e ele no violão. A gente trabalhou bem junto, então não teve o que falar mal. Não tive o porquê de falar mal.

Com essa atual situação, não parece mais haver clima para uma reunião da formação clássica do Sepultura, não é?

Não vai rolar a reunião, cara. Te falo isso hoje com certeza. Absoluta, cem por cento.

Quando conversamos para a matéria de capa da Rolling Stone, em 2007, parecia haver ainda uma esperança de isso acontecer.
Hoje em dia, até pelo que eu vejo a situação, com tudo o que já rolou... não vai rolar. E é uma coisa que eu já botei na minha cabeça, que é até melhor que não role. Porque algumas dessas reuniões nem são tao boas para falar a verdade, né? A gente não é quem era antes, então não vai ser o mesmo Sepultura se fosse hoje em dia. Estamos todos meio velhos. Olha a foto do Paulo – cabelo branco, barba branca. Até eu, não sou o mesmo moleque que pulava no palco, não tenho toda aquela energia. Não é a mesma coisa. Tentar refazer aquela magia é difícil. É uma proposta dura mesmo. Então acho que até seja melhor, talvez, na mentalidade das pessoas, que o Sepultura acabe ficando como um mito, uma lenda. Aquela fase de ouro, quem viu, viu; quem não viu, desculpe.

Acho que não vai rolar mais, cara. Aquilo passou. Daqui pra frente, são outras coisas. Até tirei da minha cabeça já. Até esqueci. A minha vida é sem o Sepultura, é sem a reunião. E eu estou bem com essa decisão. Estou legal, eu tenho outras coisas: o Cavalera, o Soulfly, o [projeto] Killer be Killed... Tá boa a vida assim, com as coisas que eu tenho. Não tenho do que reclamar. Nem preciso de uma reunião do Sepultura, para falar a verdade.

Por outro lado, acha que há a chance de reatar a amizade com o Andreas?
Eu acho que sim, inclusive é ate o contrario do que as pessoas falam. As coisas que o Andreas fala de mim não me machucam. Às vezes eu ate rio da situação. Eu não levo a serio acusações, não me aborreço com isso. Pelo trabalho que a gente fez junto no Sepultura, a gente tem um respeito grande um pelo outro. E isso não dá pra ser rompido assim tão fácil. É uma coisa que vai se solidificar. No futuro, tenho uma esperança grande de que a gente possa até voltar – se não a tocar junto, a pelo menos ser amigo. Inclusive quando a gente se encontra em turnê é legal. A gente viu o Megadeth junto em Portugal, um do lado do outro. Foi super legal, cara. Inclusive ele deu um abraço na Gloria, no ônibus. Eu fui lá depois e dei um abraço nele. Acho que isso é legal e mostra que até tem um futuro para essa amizade.

Você está com 44 anos. Quais são suas resoluções para 2014?

Minha resolução é tentar parar de tomar Coca-Cola [risos] – o que vai ser difícil. E fazer mais exercício, ficar um pouco mais equipado e preparado para a turnê. Mas o resto tá joia, não tenho nada do que reclamar. Continuo straight edge há sete anos, e acho legal, porque dá para lembrar das coisas. Você vê o mundo de uma maneira diferente, não tem aquela luta pela droga ou pelo álcool, não corro mais atrás disso. Eu corro mais atrás da musica hoje. Quero fazer uma música melhor, melhorar como músico. E como pessoa, até. Mentalmente e fisicamente, estou legal hoje em dia. E super afim de trabalhar, quero ficar em ação o ano inteiro.

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